Nem todas as palavras são vãs. Muitas vezes, podem ter uma grande utilidade. Ora por que nos transmitem informação nova e relevante, ora porque nos consolam ou motivam. As palavras proferidas por Cavaco Silva no seu discurso de ano novo foram vãs: porque não trouxeram nada de novo, porque não foram motivadoras e porque Cavaco tem um passado de culpas que não pode ser esquecido.
Vejamos: Cavaco falou na importância da democracia, apelando a que reflictamos sobre os riscos do populismo. Na realidade, Cavaco é conhecido por ser autoritário (nunca se engana e raramente tem dúvidas), por acreditar que as soluções técnicas ultrapassam a política (por isso apela aos consensos e foi sempre tão subserviente aos ditames da austeridade) e sabemos que nada fez para conquistarmos a democracia. Agora é tarde para discursos. Alertou para os perigos da corrupção, realçando que era uma obrigação de todos combatê-la. Mas quantos dos seus amigos políticos e empresários são actores principais da dita? Mencionou supostos sucessos da consolidação orçamental. Mas que sucesso é este, quando a emigração forçada está ao nível dos anos 60 e o desemprego insuportavelmente elevado? E ainda referiu a importância do bom uso dos fundos europeus. Mas será que se esqueceu que durante os seus governos esses fundos foram desbaratados?
Fez uma escolhas de temas infeliz. É que Cavaco é uma figura central na história recente de Portugal e muitos dos males a que se referiu são ainda sua responsabilidade. O Presidente da República é o guardião da constituição, o garante do regular funcionamento das instituições e uma figura protocolar. Cavaco tem cumprido mal essas funções mas o seu mandato está a terminar. O meu desejo para 2015 é que surjam candidatos a PR mais impolutos, bons oradores e com capacidade de liderança simbólica para que, em 2016, deixemos de ter uma presidência vã.
Gabriel Leite Mota, publicado no Diário Económico a 6 de Janeiro de 2015