Do bom senso se diz que toda gente está convencida que o tem em quantidades suficientes. Na realidade, o bom senso (não confundir com senso comum) é uma qualidade muito rara. E isso nota-se especialmente nos que têm responsabilidades decisórias, pois que, tantas vezes, exibem a falta dele, precisamente através das decisões que tomam. Assim, é muito difícil encontrar executivos que tenham bom senso e, por isso, devemos dar-nos por muito satisfeitos quando tal acontece.
A avaliação que faço de Rui Moreira, enquanto presidente da Câmara Municipal do Porto, é a de um presidente com bom senso. Bom senso e amor pela cidade. Pelo menos é isso que tem transparecido da sua gestão camarária. E isso, se não é tudo, anda lá muito perto.
Um bom presidente tem que gostar verdadeiramente do que está a presidir, mais do que gostar de ser presidente. E assim parece Rui Moreira: gosta de ser presidente da Câmara do Porto porque ama o Porto, não porque ama ser presidente de Câmara.
Rui Moreira demonstrou bom senso quando se coligou com Manuel Pizarro, não estando muito preocupado com jogadas partidárias. Demonstrou bom senso quando se juntou às câmaras de Matosinhos e Gaia para efectivar a Frente Atlântica. Rui Moreira mostra bom senso quando aposta no turismo, na cultura e na coesão social como pilares do desenvolvimento urbano. E é um presidente que não faz muito barulho, a não ser para projectar o nome da cidade ou reclamar a autonomia e igual tratamento face às tendências centralistas que Portugal exibe desde tempos imemoriais.
Rui Moreira tem aproveitado coisas boas que Rui Rio deixou (bairros sociais e contas equilibradas) mas promove um dinamismo cultural, turístico e simbólico que fazia falta.
Rui Moreira é um presidente tranquilo mas assertivo. Regionalista mas não provinciano. E parece gostar muito do Porto. Mais do que do FC do Porto (mas não tem que pedir desculpa por ser adepto daquele que é o maior clube, e uma verdadeira bandeira, da cidade). Mais do que do poder. Mais do que de um qualquer partido ou ideologia. Não me entendam mal: todos nós temos ideologia e Rui Moreira tem a sua. E a ideologia é fundamental em política. Porém, sem bom senso e sem honestidade as ideologias não passam de meros "slogans" para “inglês ver”. Um democrata-cristão corrupto e um socialista corrupto estão muito mais próximos do que dois comunistas entre si, se um for corrupto e o outro honesto. Isto é, a honestidade e o bom senso são os alicerces sobre os quais temos que sustentar as ideologias.
Rui Moreira encaixa bem com esta cidade. É que foram os tripeiros os primeiros a dar lições de bom senso com as suas votações camarárias, demonstrando que separam muito bem o futebol da política, que preferem o amor pela cidade a uma qualquer filiação partidária e que não aceitam presidentes arrivistas ou que vêem na Câmara Municipal apenas uma segunda escolha na sua carreira política.
Rui Moreira ainda tem muitos desafios pela frente: ilhas e bairros pobres para recuperar, trânsito para aliviar, crescimento económico e empresarial da cidade para potenciar, o centro da cidade para revitalizar habitacionalmente, populações jovens para fixar, empregos qualificados a criar. Só no final do seu mandato se poderá fazer uma avaliação mais rigorosa do seu desempenho e do que trouxe de novo à cidade. Mas confesso que sinto uma espécie de alívio, uma espécie de satisfação tranquila, ao ver que a Câmara do Porto está a ser gerida com um bom senso e ponderação raros em Portugal, que só falta é transpor para outras Câmaras e para a governação da nação.
Gabriel Leite Mota, publicado no P3 a 21 de Janeiro de 2015