Portugal é, cronicamente, um país com défice de formação académica. Um problema que começou nos tempos da ditadura de Salazar – que desvalorizava a educação do povo e que convivia bem com uma população largamente analfabeta.
Estamos a falar em 40% de analfabetos em 1950, sendo que só em 1956 a escolaridade obrigatória passa a ser de quatro anos para os homens e apenas em 1960 para as mulheres – e que se foi arrastando, estando, ainda hoje, o país na cauda da Europa no que diz respeito aos níveis médios de formação da sua população.
As investigações económicas são unânimes a reconhecer a importância decisiva da formação académica para a competitividade de uma nação. Ao mesmo tempo, é através da formação em massa das populações que se consolida uma democracia, se aprofundam o civismo e as competências profissionais e sociais, e se promove a verdadeira igualdade de oportunidades e a mobilidade social.
Ou seja, a aposta na formação promove a eficiência e a equidade. Não só é dos investimentos públicos mais rentáveis a médio prazo (ou seja, os custos são largamente recuperados), como conjuga essa dupla vertente de promoção da eficiência e da equidade, o que é raro.
Com a evidência sólida de que a formação académica é decisiva para a saúde económica e social, não admira que esta questão esteja presente na agenda política (lembremo-nos de Guterres e da sua paixão pela educação).
Ainda assim, Portugal continua atrasado, e penso serem necessários todos os instrumentos para ultrapassar esse atraso.
Uma das ferramentas que mais rapidamente combate a falta de formação é a escolaridade obrigatória e gratuita. Num país relativamente pobre e em que não há uma cultura de valorização da escola, tornar o ensino obrigatório tem sido a forma mais eficaz de atacar o problema: evita-se que as crianças sejam “desviadas” precocemente para o mercado de trabalho por questões financeiras ou ideológicas e cria-se uma cultura pró-ensino nas gerações mais formadas.
Ao longo do tempo, Portugal passou, durante a ditadura, da inexistência de escolaridade obrigatória para a escolaridade obrigatória de quatro anos e, durante a democracia, para os seis, depois nove e, finalmente, 12 anos.
Esta progressão foi também impulsionada pela nossa presença na UE, que faz harmonizar as escolaridades obrigatórias nos diferentes Estados-membros.
Ainda no âmbito da UE, a reforma de Bolonha estandardizou o ensino superior a nível europeu, passando as licenciaturas portuguesas, de cinco para três anos. E é aqui que entra a questão do título. Estando Portugal atrasado ao nível das suas qualificações, porque não considerar a possibilidade de aumentar mais três anos à escolaridade obrigatória, garantido que todos os portugueses obtenham formação superior?
É que as licenciaturas de Bolonha já são cursos rápidos e pouco aprofundados, ao alcance do estudante mediano. Se se adoptasse esta medida, ter-se-ia que reformular o ensino superior nacional, aumentando muito a oferta politécnica e profissionalizante (e a formação de adultos) e reduzindo a oferta universitária (afinal, só uma minoria das pessoas quer seguir um percurso mais científico).
Sabendo-se que a aposta no ensino superior garante bons retornos individuais, mas também sociais (as chamadas externalidades positivas), esta seria uma forma de aumentar a nossa produtividade, combater as desigualdades, incrementar a exigência sobre a política e densificar a democracia.
Portugal é um país com baixa produtividade, baixos salários, elevada desigualdade e baixas qualificações. A aposta na educação é decisiva para combater todos esses problemas. Ser inovador a nível europeu e apostar em 15 anos de escolaridade obrigatória e gratuita podia ser a chave para a aceleração do país e sua transformação estrutural (apesar dos custos iniciais).
Gabriel Leite Mota, publicado no Jornal Económico a 1 de Agosto de 2019